Teixeira/Gonçalves
O Fundo Teixeira/Gonçalves da Biblioteca Geral da Universidade de Évora constitui um acervo ímpar na bibliografia geológica portuguesa. Graças ao empenho, dedicação e trabalho desinteressado dos Professores Carlos Teixeira e Francisco Gonçalves, os 4507 títulos agora ao dispor da Comunidade Científica constituem um ponto de partida para trabalhos a realizar em Portugal Continental (412), Madeira (18), Açores (16), Cabo Verde (22), São Tomé e Príncipe (7), Guiné Bissau (41), Angola (165), Moçambique (71), Diu (13), Damão (2), Goa (35), Macau (4), Timor Leste (30) e ainda no Brasil (46). Para além disso, reúne ainda trabalhos referentes à Geologia mundial resultado de ofertas e trocas bibliográficas com colegas e instituições estrangeiras. As referências mais recentes datam de 1992 e as mais antigas de 1880, algumas são muito raras ou mesmo únicas.
Carlos Teixeira é uma figura incontornável da geologia portuguesa. Começou o percurso académico universitário em 1929 na Universidade do Porto, onde, por constrangimentos económicos, ingressou na Licenciatura em Ciências Histórico-Naturais (4 anos) quando na verdade pretendia seguir Medicina (6 anos). Começou por estudar Botânica e Antropologia, em 1937 por orientação de Rosas da Silva enveredou pelas Ciências Geológicas tendo inicialmente trabalhado em Paleobotânica. A paixão pela Geologia cresceu de tal modo que, nas palavras de Francisco Gonçalves, “toda a sua vida foi um verdadeiro sacerdócio inteiramente dedicada ao estudo, à investigação, à docência e à preparação de futuros geólogos e professores, sobretudo, através do patrocínio dado a numerosos doutoramentos ”. A sua obra é imensa e não se limitou a Portugal Continental, também trabalhou e promoveu estudos geológicos nos arquipélagos insulares da Madeira e Açores e em todos os territórios ultramarinos então governados por Portugal. Esta vida de dedicação deixou um vasto património bibliográfico que parcialmente se perdeu no incêndio da Escola Politécnica ocorrido na madrugada de 18 de março de 1978 e que, com muita dedicação, foi parcialmente recuperado por Francisco Gonçalves.
Francisco Gonçalves foi um dos discípulos de Carlos Teixeira, o mais fiel e leal, aquele que o acompanhou nos últimos anos da sua vida. Praticamente cego e fisicamente debilitado mas possuidor de uma memória excepcional, Carlos Teixeira teve em Francisco Gonçalves uma extensão de si próprio que lhe permitiu publicar até praticamente ao dia em que faleceu. Como exemplo, realçamos o caso do livro “Introdução à Geologia de Portugal “ publicado em 1980 e cujos manuscritos também haviam sido consumidos no incêndio de 1978. A versão que chegou ao prelo foi integralmente ditada por Carlos Teixeira a Francisco Gonçalves que complementava os registos com observações baseadas na experiência própria e escolhia as ilustrações que mais se adequavam ao texto.
Francisco Gonçalves dedicou a maior parte da sua investigação ao estudo geológico do Alentejo. Aqui foi pioneiro e até visionário em muitas áreas. Geologicamente e não só, conhecia a região palmo-a-palmo. Na Universidade de Évora deixou obra feita. Mais que Professor e Orientador era um Amigo, exigente mas justo, com quem era muito fácil trabalhar e que muito deixou por ensinar. O Departamento de Geociências cresceu, ganhou autonomia e dimensão devido à sua crença que a Geologia tinha futuro no Alentejo, o que continua válido agora que os Recursos Minerais, em que o Alentejo é particularmente rico, são apresentados como opção estratégica para o desenvolvimento económico para Portugal.
O Fundo Teixeira/Gonçalves, que agora se apresenta, presta singela homenagem à memória de dois vultos incontornáveis no panorama geológico português e que, conhecendo a sua Vida e Obra se enquadra perfeitamente no espírito de abnegação e altruísta que ambos partilhavam colocando o seu trabalho à disposição da Comunidade Científica.
Luís Lopes
Universidade de Évora
Escola de Ciências e Tecnologia - Departamento de Geociências e Centro de Geofísica de Évora